Por que John Owen e Richard Baxter não gostavam um do outro?

Como as pessoas nos veem

Quando entrei no ministério pastoral de tempo integral muitos anos atrás, havia uma pessoa na congregação que, lamento dizer, eu fazia de tudo para evitar. Era um homem idoso com uma expressão sombria, opiniões impassíveis e modos antiquados. Mas não havia como evitá-lo por muito tempo em uma igreja pequena, e quanto mais eu interagia com ele, mais eu passava a gostar e respeitá-lo. Longe de fugir quando o via vindo em minha direção, comecei a procurá-lo intencionalmente.

Mais recentemente, tive a experiência oposta. Alguém com quem eu ocasionalmente interagi ao longo de muitos anos, e que eu considerava totalmente profissional e confiável, disse algo sobre mim em um ambiente público que, na minha opinião, não foi apenas antiético, mas também profundamente pessoal. Dadas as nossas interações anteriores positivas, fiquei surpreso, para dizer o mínimo, com o que estava ouvindo. Eu não tinha ideia de que ela sentia isso.

O fato é que não vemos as pessoas como elas realmente são. Isso não deve ser surpresa. Eu tenho cinquenta e quatro anos e não tenho certeza se conheço a mim mesmo, quanto menos outra pessoa. Somente Deus nos vê como realmente somos. Quando vemos outras pessoas, fazemos isso através de um filtro que opera com base na única evidência que temos: o que vemos elas fazerem e ouvimos elas dizerem. É fácil interpretar isso errado.

Quando meus filhos eram mais novos, eles gostavam de tirar fotos minhas — e não com propósitos lisonjeiros. Eles aplicavam todos os tipos de filtros distorcidos que transformavam meu rosto em algo grotesco e perturbador. Eu ainda conseguia me ver na imagem, mas estava deformada, quase impossível reconhecer. Acho que fazemos algo semelhante quando olhamos para outras pessoas. Se não tomarmos cuidado, permitiremos que suas ações distorçam nossa visão deles a tal ponto que se tornam quase irreconhecíveis.

Desentendimento do Século XVII

Isso não é algo novo. Alguns anos atrás, eu me propus a entender por que dois gigantes puritanos ingleses do século XVII passaram a não gostar um do outro de maneira tão profunda. John Owen (1616-1683) e Richard Baxter (1615-1691) tinham tanto em comum que deveriam ter se dado muito bem. Mas isso não aconteceu. Isso se deveu em parte às suas personalidades contrastantes e experiências de vida que predeterminaram a trajetória de seu relacionamento antes mesmo de se conhecerem. Mas também se deveu à natureza de suas interações uma vez que entraram em contato. Olhando para trás, podemos ver como seus respectivos filtros entraram em ação.

Não ajudou em nada que Baxter tivesse criticado, anteriormente, a teologia de Owen por escrito, mesmo que tenha feito isso de uma maneira que, para ele, foi relativamente moderada. Owen não era alguém que aceitava críticas facilmente, especialmente críticas públicas. Então, quando os dois homens se encontraram em 1654 como parte de um pequeno grupo de ministros ingleses de destaque para aconselhar o Parlamento sobre um novo acordo religioso, Baxter reforçou, com seu comportamento, o que Owen já havia presumido devido sua disputa impressa: que Baxter era um insuportavelmente irritante. Baxter, que observou que Owen era “o grande executor” dentro do grupo, sentiu que viu, com seus próprios olhos, o orgulho e o melindrismo de Owen. Assim, sua interação pessoal simplesmente reforçou suas crenças preexistentes, e o filtro de cada um foi reforçado e aguçado. Como consequência, suas interações escritas subsequentes tornaram-se visivelmente mais amargas e pessoais.

Dois anos antes, um colega puritano havia identificado a dinâmica geral que estamos observando. Em seu livro The Moderator, Joseph Caryl explicou que a pessoa que “não confia em seus vizinhos impede que eles confiem nele, e aquele que teme os outros cria neles um medo contra si mesmo”. Se alguém pensa que o outro não confia nele, ele “prontamente suspeitará no outro”. Assim, “se eu der lugar a esses pensamentos, estou em guerra com ele em meu coração e a única coisa que pode fomentar a confiança nele, a afeição do amor cristão e a sinceridade generosa, se perde entre nós.” É exatamente assim que os relacionamentos se rompem. Em nossas interações iniciais e quando o conflito se inicia, aquelas qualidades preciosas de amor e generosidade são rapidamente perdidas, e, a partir daí, é quase impossível recuperar um relacionamento.

Assim foi com Baxter e Owen. O pior aconteceu em 1659, quando Owen cometeu o que, aos olhos de Baxter, foi seu pecado imperdoável. Naquela época, Owen era capelão dos principais líderes militares da Inglaterra, que, de fato, orquestraram um coup d’état [golpe de Estado]. Suas ações derrubaram o regime republicano do Lorde Protetor, Richard Cromwell (o filho do mais conhecido Oliver Cromwell). Baxter depositava em Richard Cromwell esperanças extremamente altas para uma transformação da religião inglesa, mas todas as suas expectativas e otimismo viraram pó e ruína com a queda de Cromwell. Um ano depois, a monarquia foi restaurada, a reforma puritana da Inglaterra foi revertida, e Baxter, junto com cerca de dois mil outros ministros puritanos, estavam a caminho de serem expelidos de suas posições na Igreja da Inglaterra.

Quem foi o culpado? John Owen. Pelo menos, essa era a visão de Baxter. Mas enquanto Owen estava à margem desses eventos e, talvez, pudesse ter ajudado a impulsioná-los, ele estava longe de ser o jogador mais poderoso. Ele ficou tão desolado com esses resultados quanto Baxter. Quanto a Baxter, ele estava trabalhando com informações de segunda mão que eram, no melhor dos casos, frágeis. Mas ele acreditou. Ele acreditou porque elas se encaixavam perfeitamente em seu filtro, através do qual era totalmente plausível que Owen tivesse destruído tudo. Pelo resto de seus dias ele continuou culpando Owen pelo fim trágico da piedosa reforma na Inglaterra. E isso importava. Esses dois homens foram os principais líderes durante os trinta anos em que os puritanos sofreram perseguição estatal devido a sua não conformidade às exigências da igreja estabelecida. Onde eles poderiam ter unido suas respectivas correntes em uma causa comum, sua história e sua animosidade mútua os impediram de trabalhar em uníssono. Esse filtro prejudicial e distorcido havia gerado suas consequências.

Acho que há uma lição nisso para nós. É muito fácil permitir que ofensas e mágoas percebidas se acumulem a ponto de, no final, vermos a outra pessoa apenas através de um prisma de dor e ofensa. Estou determinado a refletir sobre isso enquanto continuo a interagir com a pessoa que recentemente me decepcionou. Sei que não posso ser tão aberto com ela quanto fui — a confiança é uma mercadoria preciosa que é difícil de reconstruir uma vez que é perdida—mas não deixarei que essa única ação determine nosso relacionamento, e encontrarei maneiras de manter a comunicação e a trabalho conjunto abertos. O exemplo preocupante de Owen e Baxter nos ensina isso. Que possamos todos demonstrar o fruto do Espírito—sobretudo amor, paz, paciência, bondade, mansidão e autocontrole—e, quando encontrarmos o pior nos outros, que isso traga o melhor de nós mesmos.

 


 

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